Na cidade tem atualmente 76 flanelinhas cadastrados.
Secretário de Ordem Pública afirma que lei federal é genérica.
Estacionar nas ruas do Centro de Petrolina, no Sertão pernambucano, é a certeza de ouvir questionamentos do tipo “Vai lavar hoje, patrão?” ou avisos como “Tô olhando viu!”. O que chega aos ouvidos, muitas vezes de forma intimidadora, vem de flanelinhas, profissionais autônomos que lavam ou guardam veículos, se registrado em órgãos do trabalho, de acordo com a legislação. Mas, onde não há registro, também não há fiscalização suficiente para coibir atos que beiram o crime, como as ameaças feitas por parte da categoria.
Flanelinha há oito anos, Marcones Alves da Silva, de 35 anos, marca seu ponto ao lado dos hospitais e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), no Centro da cidade. No local há um alto fluxo de veículos que circulam diariamente. O flanelinha afirma que o seu trabalho é a base do sustento da família. “Antes, quando não estava nessa crise financeira, a gente tirava R$ 450 por semana. Mas com a crise, não chega a R$ 300”, disse Marcones, que começa a vida de guarda-carros às 6h.
Seu trabalho segue até o final da tarde e, segundo ele, é mais válido ser flanelinha do que ter outro tipo de emprego. “Eu vim para cá através do meu cunhado que trabalhava desde pequeno aqui neste ponto. Vim e me acostumei. Porque para trabalhar em qualquer serviço por aí, sem futuro, é melhor ficar aqui mesmo”, pontuou o flanelinha que destaca não impor quanto o 'cliente deve pagar pelo serviço'. “Eu não cobro, vai da vontade da pessoa de dar o valor que quer. Tem dias que é bom e outros razoáveis. Assim a gente leva a vida”, comentou o flanelinha, antes trabalhador rural e operário na construção civil.
Eliomar Temístocles Silva Simões, de 34 anos, é novato na profissão. Está há apenas dois meses trabalhando como flanelinha próximo à Justiça Federal, também no Centro da cidade. Ele conta que antes de resolver tornar-se lavador de carro já trabalhou como gari e vendedor de água de coco. “Tenho trabalho de tudo que você imaginar. Vim para cá porque o custo de vida agora está muito difícil”, destacou Eliomar.
A falta de formação profissional e muitas vezes a má fé dos flanelinhas acabam prejudicando uma parcela deles que tenta fazer daquilo um meio de sobrevivência. Mas lidar com a resistência de pessoas já acostumadas a serem extorquidas e ameaçadas por integrantes da categoria torna-se uma tarefa nada fácil. “O trabalho aqui é bom, mas uns entram no carro e não valorizam. Tem gente que passa e não dá ousadia. Pergunto se vão lavar o carro, a pessoa passa e nem olha. Ninguém é obrigado a tratar bem, mas somos discriminados porque, por causa de alguns, todos pagam”, ressaltou Eliomar.
O que Eliomar queria expressar é a relação de parte dos flanelinhas com o uso de drogas. Tanto ele quanto Marcones dizem que estão fora dessa situação tão comum entre os lavadores e guardadores de carros. E é para sustentar o vício que, muitas vezes, a abordagem feita aos condutores torna-se tão ameaçadora. “Não é mentira que tem flanelinha que já chega inibindo, já tentando subornar a pessoa para não fazer nada contra ele ou contra o carro. Se a pessoa dá R$1 ou R$2, tem flanelinha que acha ruim. Aí o motorista já não vem mais e começa a xingar a gente. O sistema é este”, disse Marcones.
Um ambulante que trabalha na mesma área dos flanelinhas preferiu não ser identificado por medo de sofrer ameaças, mas disse ao G1 que já presenciou cenas fortes que envolvem uso e tráfico de drogas na localidade. “É tanta história forte que a gente vê por aqui com flanelinhas que ninguém imagina. São usuários de crack, que muitas vezes mentem, dizem que estão com fome, que o dinheiro é para comer e pedem R$ 5 ou R$ 6 reais ao cliente”, contou o ambulante que se sente inseguro tendo que trabalhar no local. “Como não pode colocar um guarda o dia todo? O poder público não age. Se eles quisessem, tiravam este povo que usa droga daqui. Até prende, mas no outro dia eles estão de volta. O cidadão é quem fica vítima”, disse o ambulante.
Atualmente, a cidade de Petrolina tem 76 flanelinhas cadastrados. Em 2015, foram 11 novos. A maior parte deles está na Praça Dom Malan, da Catedral da cidade. Eles foram cadastrados pelo Centro de Referência Especializado para a População em Situação de Rua (Centro POP). Mas nos registros do Centro também há flanelinhas em avenidas como a Castro Alves e ao lado do Museu. O Centro POP oferece serviços voltados à população em situação de rua com abordagens sociais, escutas e orientações psicológicas, além de cadastros em programas sociais como o Bolsa Família, entre outros.
De acordo com o diretor do local, Evaldo Francisco de Souza, já foi feita uma reunião entre a Polícia Militar, a Secretaria de Ordem Pública e os flanelinhas para tentar coibir os danos ao patrimônio e as agressões aos cidadãos. Ele destaca que o Centro realiza a parte social, dando assistência à categoria, mas não pode ter o papel de coibir. “A gente faz a abordagem e tenta encaminhar os que são usuários de drogas para o tratamento, mas eles não aceitam. São muito resistentes.”, disse
Segundo Evaldo Souza, a solução seria qualificar os flanelinhas para, então, poder legalizá-los como profissionais registrados no município, porém ainda não existe um projeto que integre o Centro POP e a Secretaria de Ordem Pública, que ficaria responsável pela fiscalização. “Depois do disciplinamento seria mais fácil trabalharmos. A nossa proposta é buscar junto ao Sebrae um serviço de qualificação e a questão de legalização”, explicou.
A lei federal que rege os lavadores e guardadores de veículos é de 1975 e consta que, para exercer a profissão, é preciso um registro em Delegacias Regionais do Trabalho em convênio com órgãos da Administração Pública Federal, Estadual ou Municipal. De acordo com o secretário de Ordem Pública de Petrolina, Jenivaldo dos Santos, a legislação federal é genérica, o que provoca a necessidade da criação de normas municipais.
“Tem que ter uma norma municipal que trate melhor esta questão. A lei federal é genérica e cada cidade tem suas particularidades. Penso que tem que ter uma ampla discussão com a população. Ela quer isso mesmo? Qual a punição? A lei federal não é clara para estes pontos. Tem que ter uma norma que embase o órgão fiscalizador”, destacou o secretário de Ordem Pública. (fonte: Amanda Franco Do G1 Petrolina)
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