'Se não tem sabão, imagina álcool. É artigo de luxo', diz moradora da periferia de Fortaleza



Moradores da Comunidade do Gengibre, no bairro Manuel Dias Branco, sofrem com a falta de estrutura — Foto: Natinho Rodrigues

O Ceará é o terceiro com mais casos de Covid-19 confirmados no Brasil e é na periferia de Fortaleza que a taxa de mortalidade mais preocupa. Segundo a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece), o município conta, atualmente, com 62,54% de cobertura de esgotamento sanitário e 98,65% de cobertura do serviço de abastecimento de água.

Os dados indicam que os serviços básicos para manter uma higiene adequada e tentar se livrar de doenças chegam a maioria dos bairros, mas não a todos. No Lagamar, comunidade localizada no bairro Aerolândia e onde moram a assistente social Adriana Gerônimo, 30, e a dona de casa Regina Jaqueline Silva, 37, somente uma parte da área é atendida com rede de esgoto.

Jaqueline sempre teve o Lagamar como morada: "Saí da maternidade e vim para cá". A dona de casa traz na memória uma situação precária, que melhorou ao passar dos anos, mas segue longe de ser suficiente para, segundo ela, se "viver com dignidade". O esgoto mais perto da casa dela é o que fica a quase 30 metros, na esquina.

Adriana afirma que cumprir o isolamento social na comunidade é uma das dificuldades, porque "as casas são pequenas e sem circulação de ar". Segundo a assistente social, os moradores tentam reduzir os danos e se ajudam como podem: "Nós já sabemos de dois casos confirmados no Lagamar. Aqui, a rua é extensão da nossa casa. Tentamos fazer com que os materiais de higiene cheguem ao maior número de moradores. Se não tem sabão, imagina álcool. É artigo de luxo", revelou.

A Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) registrou 6.783 casos confirmados do novo coronavírus (Sars-Cov-2) no estado e 397 mortes em decorrência da doença. Os dados foram divulgados por meio da plataforma IntegraSUS às 17h17 desta segunda-feira (27). Há ainda outros 116 óbitos suspeitos que aguardam resultados de testes para saber se foram por Covid-19.

Gengibre

O estudo de desenvolvimento humano de Fortaleza elaborado pela Secretaria Municipal do Desenvolvimento Econômico do Município, a partir do Censo Demográfico de 2010, apontou que bairros da capital com piores Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em diferentes quesitos.

No bairro Manuel Dias Branco consta o pior IDH de longevidade. É lá onde está uma das mais populosas comunidade, a do Gengibre.

À beira da lagoa, dezenas de pessoas ergueram casas com paredes de tábua. Silvanete Rodrigues mora no Gengibre, em uma casa construída a cerca de 50 metros de distância da lagoa. A dona de casa afirma agradecer todos os dias por não ter nenhuma confirmação de pessoa infectada pelo novo coronavírus na comunidade.

"A gente procura se prevenir lavando as mãos e vamos vivendo com a ajuda de voluntários. O que tem de álcool e máscara é tudo doação. O carro do lixo não está mais entrando aqui. Vem um rapaz em uma moto três vezes por semana e leva o que dá. A lagoa também não está mais sendo limpa. Isso preocupa a toda comunidade. Tem muita gente que usa, todos os dias, a água dessa lagoa", afirmou Silvanete.

Respostas

A Cagece admite que a Comunidade do Gengibre não possui rede de esgoto disponível. De acordo com a Companhia, a legislação traz que "nos locais onde não há rede de esgotamento disponível, os proprietários dos imóveis são responsáveis pelo descarte adequado dos dejetos gerados".

Também segundo a Companhia, há um trabalho para ampliar o serviço de esgotamento sanitário em Fortaleza, com objetivo de alcançar a universalização. A Cagece pontuou que durante o estado de emergência com o novo coronavírus está garantindo a prestação do serviço com reforço nas operações de abastecimento de égua e esgotamento sanitário, além de medidas protetivas.

O G1 também entrou em contato com a Prefeitura de Fortaleza por meio da Secretaria Municipal dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS) e Coordenadoria Especial de Articulação das Secretarias Regionais (Coareg) a fim de obter informações sobre ações adotadas em prol dos moradores das periferias durante a pandemia da Covid-19, assim como ter acesso às respostas acerca das reclamações específicas de cada comunidade mencionada. As Pastas não responderam até a publicação desta matéria. As informações são de Emanoela Campelo de Melo / G1 CE.

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